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A Falácia da Sororidade e a Política na OAB: O Retrocesso das Mulheres no Poder

Ilustração: Arquivo.Net
Ilustração: Arquivo.Net

 

A política brasileira, em especial nas eleições das OABs, tem sido um reflexo de um sistema falho de representação que, ao invés de promover a inclusão, perpetua a exclusão e o retrocesso social. Apesar dos discursos progressistas e das conquistas formais, como a sororidade e a busca por maior representatividade das mulheres, a prática política muitas vezes revela um cenário de retrocesso. Este artigo propõe uma reflexão crítica sobre o que está em jogo nas eleições e nas representações políticas de mulheres, especialmente negras, pois mulheres indígenas se quer existem nesses espaços, nas OABs e no contexto mais amplo da sociedade. A pergunta central que guia esta discussão é: até que ponto estamos realmente avançando na luta pela igualdade de gênero e pela verdadeira representatividade política, ou estamos apenas reproduzindo velhas estruturas de poder e exclusão?

 

No Brasil, o sistema político continua sendo marcado pela manutenção de velhas estruturas de poder, que frequentemente ignoram os reais interesses da população, especialmente dos grupos historicamente marginalizados. As eleições das OABs, que reelegeram figuras já consolidadas no poder, refletem essa falta de mudança efetiva. Apesar da maioria dos eleitores ser composta por advogados e advogadas de grupos excluídos, continuamos a eleger líderes que muitas vezes não atendem às necessidades e direitos dessa população. Esse fenômeno é sintomático de uma sociedade despolitizada, em que os eleitores, muitas vezes, se deixam enganar por discursos vazios e manipulações de campanhas eleitorais.

 

Além disso, o discurso de "sororidade", frequentemente levantado como um pilar da luta feminina, se mostra muitas vezes superficial e excludente. O feminismo, no contexto da política das OABs e das lutas em geral, tem se mostrado fragmentado, com uma grande divisão entre as advogadas que têm acesso a cargos de poder e aquelas que estão à margem. Advogadas negras, indígenas, e de classe baixa enfrentam uma hostilidade imensa para se lançarem como candidatas ou, quando o fazem, para ocupar espaços significativos de poder. A competição e a falta de apoio entre as próprias mulheres, motivada por medo, insegurança ou conformismo, revelam as profundas contradições no movimento feminista, que deveria ser, por essência, solidário e inclusivo.

Essa realidade é ainda mais grave quando observamos que as mulheres que chegam ao poder, muitas vezes, não estão comprometidas com as mudanças necessárias, mas sim com a manutenção do status quo, reproduzindo práticas de dominação e exclusão que não contemplam a diversidade das mulheres, especialmente as mais marginalizadas. Essa dinâmica de "competição" entre mulheres é um reflexo de um sistema político e social que ainda não consegue abraçar a pluralidade e a real transformação.

A luta pela igualdade de gênero e pela representatividade política genuína exige mais do que apenas discursos e propostas superficiais. Ela demanda ações concretas, solidariedade real e uma união entre todas as mulheres, sem exceção. A sororidade, se verdadeira, deve ser inclusiva e prática, e não uma ferramenta de exclusão ou competição. O sistema político nas OABs precisa refletir mais profundamente sobre como ele, e nós enquanto sociedade, escolhemos nossos representantes de classe e quais valores realmente estão sendo defendidos nas urnas. A verdadeira transformação não virá apenas com o avanço de algumas advogadas em posições de poder, mas com a inclusão de todas – especialmente advogadas negras, indígenas e periféricas – que devem ter seu espaço garantido na política e em todas as esferas decisórias. A luta feminista deve ser coletiva e transformadora, e não podemos mais permitir que ela seja desvirtuada pela falta de união e pela perpetuação de um sistema que privilegia algumas em detrimento de outras.

 

Imagem: Arquivo.Net
Imagem: Arquivo.Net

Em conclusão, é urgente a transformação do sistema político na OAB e em outras esferas de poder, que atualmente perpetuam um modelo excludente e desigual. O discurso de sororidade, se genuíno, deve ser capaz de superar as divisões internas entre as mulheres e garantir que todas, especialmente aquelas que historicamente têm sido marginalizadas – como as advogadas negras, indígenas, ciganas e de classes populares – tenham suas vozes ouvidas e seus direitos respeitados. O status quo, que privilegia os homens brancos, ricos e heteros, não pode ser mais aceito como norma. A verdadeira representatividade política, que leve em conta a diversidade das experiências femininas e a necessidade de uma justiça social ampla, só será alcançada quando houver uma ruptura com as práticas de exclusão e um comprometimento real com a inclusão. A luta por igualdade de gênero deve ser coletiva, sólida e transformadora, para que o avanço das mulheres não seja medido pelo sucesso de poucas, mas pela mudança estrutural que beneficie todas, sem exceção. Para isso, é fundamental que repensemos a política da OAB e de outras instituições, adotando um modelo que realmente atenda aos interesses da maioria, e não apenas de uma elite dominante.


*Inory Kanamari - Primeira advogada indígena do povo kanamari. Atuou como presidente da Comissão de Amparo e Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da OAB/AM de 2022 a 2024, Vice-presidente da Comissão Especial de Amparo e Defesa dos Povos Indígenas no Conselho Federal da OAB de 2023 a 2024, atuou como Consultora no projeto de tradução da Constituição Federal para a língua indígena nheengatu no Conselho Nacional de Justiça. Articulista da Revista Cenarium, ativista, poetisa, membra na ALCAMA (Academia de Letras, Ciência e Cultura da Amazônia). Escreve como colaboradora toda terça-feira e aos sábados para o Portal Info.Revolução.
*Inory Kanamari - Primeira advogada indígena do povo kanamari. Atuou como presidente da Comissão de Amparo e Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da OAB/AM de 2022 a 2024, Vice-presidente da Comissão Especial de Amparo e Defesa dos Povos Indígenas no Conselho Federal da OAB de 2023 a 2024, atuou como Consultora no projeto de tradução da Constituição Federal para a língua indígena nheengatu no Conselho Nacional de Justiça. Articulista da Revista Cenarium, ativista, poetisa, membra na ALCAMA (Academia de Letras, Ciência e Cultura da Amazônia). Escreve como colaboradora toda terça-feira e aos sábados para o Portal Info.Revolução.







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