Saiba quem é a professora da UFPA conhecida como a “João de Deus da Antropologia
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- há 14 horas
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Por Inory Kanamari — Advogada indígena, com atuação em defesa dos direitos dos povos originários
Quem é a professora da Universidade Federal do Pará, conhecida nos corredores como a “João de Deus da Antropologia”?
Bem, para responder a essa pergunta, é preciso compreender que, assim como o famoso “curandeiro” de Goiás, ela também detinha um poder quase místico sobre suas vítimas e, curiosamente, um poder ainda maior sobre seus pares e superiores.
Durante anos, a professora colecionou relatos de abusos, humilhações e violências praticadas contra negros, indígenas, pessoas com deficiência, idosos, estrangeiros e alunos de origem popular. Seu currículo informal era extenso, não de publicações científicas, mas de traumas e silenciamentos. E, assim como no caso de João de Deus, todos sabiam. Todos. Professores, reitores, coordenadores. Mas, na UFPA, o silêncio sempre foi o maior aliado da impunidade.
Reza a lenda que o segredo do sucesso da “Joana de Deus da Antropologia” estava no que ela oferecia em troca: influência, favores, colaborações, “apoio acadêmico”. Afinal, quando o corporativismo é a verdadeira religião da universidade, quem ousaria desafiar uma de suas sacerdotisas?
Em 2025, após décadas de abusos e omissões, centenas de vítimas, alunos, ex-alunos, servidores e até candidatos a mestrado e doutorado, resolveram romper o silêncio. Vieram à tona denúncias de racismo, xenofobia, perseguição, abuso de poder e discriminação sistemática. A enxurrada de relatos era tão ampla que cruzava fronteiras: havia vítimas do Pará, de outros estados e até de outros países. E qual foi a reação da respeitável instituição diante desse clamor coletivo?
Uma homenagem.
Sim, uma homenagem à professora denunciada. Um gesto simbólico, digno da ironia trágica que marca a história de muitas universidades públicas brasileiras: a celebração da opressão travestida de mérito acadêmico.
Enquanto as vítimas relatavam anos de tortura psicológica e exclusão, a UFPA mantinha sua tradição de proteger os seus. Afinal, o cooperativismo institucional é um patrimônio imaterial da casa, mais valioso que qualquer política de direitos humanos. Quem ousava denunciar era rapidamente silenciado, perseguido, desmoralizado. A estrutura inteira se movia como um corpo único para proteger a agressora e punir a vítima.
E quando as denúncias se multiplicaram a ponto de se tornarem impossíveis de ignorar, a universidade adotou a mais refinada das estratégias: transformar a agressora em vítima. Segundo o discurso interno, as centenas de denunciantes, de diferentes estados e países, que nunca se conheceram, teriam acordado um belo dia decididas a conspirar contra a “pobre professora”. Genial, não? Um roteiro digno de ficção científica ou de um relatório institucional.
Nada, porém, surpreende quem conhece a política interna da UFPA: uma engrenagem elitista, racista, classista e xenofóbica, que transforma a proteção de “figuras influentes” em política de Estado.
A “João de Deus da Antropologia” é apenas o sintoma mais visível de uma doença antiga, cultivada com zelo acadêmico e regada a conivência, silêncio e autoproteção.
E assim, enquanto as vítimas seguem sem justiça, a universidade segue fiel à sua vocação: produzir conhecimento, diplomas e, sobretudo, impunidade.
