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Ex-Presidente da FUNAI de Bolsonaro é condenado: a queda de Marcelo Xavier, braço "indigenista" do Bolsonarismo

Por Inory Kanamari — Advogada indígena, com atuação em defesa dos direitos dos povos originários


Há nomes que carregam o peso da história e há outros que simbolizam o peso da injustiça. Marcelo Augusto Xavier da Silva é um desses nomes que marcaram um dos períodos mais sombrios da política indigenista brasileira. Ex-delegado da Polícia Federal, homem branco, rico e fiel súdito de Jair Bolsonaro, Marcelo transformou a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) criada para proteger os povos originários em um instrumento de perseguição, desmonte e violência institucional.

Durante sua gestão (2019–2022), os números falaram por si: recordes de desmatamento, assassinatos de lideranças, invasões em massa a territórios indígenas e o total abandono de políticas públicas em meio à pandemia que vitimou quase 600 indígenas e contaminou mais de 19 mil pessoas. Enquanto povos inteiros lutavam pela sobrevivência, Marcelo Xavier telefonava para grileiros, servia aos ruralistas e se vangloriava por seguir à risca a promessa de Bolsonaro de não demarcar “um centímetro de terra indígena”.

Mas o tempo, esse velho aliado da verdade,  cobra seus acertos. E, neste 15 de outubro de 2025, a Justiça finalmente alcançou o homem que tantos povos viram agir com impunidade.


A sentença do juiz federal Thadeu José Piragibe Afonso, da 2ª Vara Federal Criminal do Amazonas, condenou Marcelo Xavier a 10 anos de reclusão por duas práticas do crime de denunciação caluniosa (art. 339 do Código Penal). Segundo o Ministério Público Federal, o ex-presidente da FUNAI, de forma dolosa e sabidamente injusta, deu causa à instauração de inquéritos falsos contra servidores da própria FUNAI, lideranças do povo Waimiri Atroari e até contra o procurador da República Igor Spínola, apenas para retaliar aqueles que defendiam os direitos indígenas e denunciavam suas ações abusivas, conforme trechos da sentença, vejamos:


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Em outras palavras: Marcelo Xavier usou o poder público não para proteger, mas para perseguir. Não para servir à lei, mas para intimidar quem ousasse resistir.

A sentença é mais do que uma condenação penal é um ato simbólico de reparação histórica. Porque, quando a Justiça reconhece que o ex-presidente da FUNAI cometeu crimes justamente contra aqueles a quem deveria proteger, ela reconhece, ainda que tardiamente, o sofrimento de centenas de povos que padeceram sob seu comando.

O juiz foi claro ao afirmar que os motivos do crime foram gravíssimos, movidos por retaliação contra servidores comprometidos com os povos indígenas. O magistrado ressaltou o “profundo desprezo” de Xavier pelos objetivos institucionais da FUNAI e destacou que sua conduta “quebrou a confiança construída ao longo dos anos entre o órgão e os Waimiri Atroari”, reabrindo feridas da ditadura militar, período em que esse mesmo povo foi brutalmente massacrado.


Sim, Marcelo Xavier foi condenado a 10 anos de prisão em regime fechado. Mas o que está em jogo vai além da pena: é o reconhecimento de que a política indigenista não pode ser capturada por interesses do agronegócio, nem servir de palco para ideologias de extermínio.


A sentença de hoje é uma linha de virada. Ela representa a resistência dos povos que sobreviveram à “Esplanada da Morte”, termo cunhado para definir a política genocida de Bolsonaro e seus ministros. Representa as vozes caladas de Paulo Paulino Guajajara, Zezico Rodrigues, Firmino Prexede, e tantos outros líderes assassinados enquanto a FUNAI, sob Xavier, se calava.


Para muitos de nós, indígenas, a condenação de Marcelo Xavier é um respiro, não de vingança, mas de justiça.Porque justiça, para os povos originários, nunca foi apenas uma questão jurídica: é a reafirmação de que existimos, resistimos e que, apesar de tudo, continuamos de pé.


Marcelo Xavier pensou que poderia apagar nossos rastros da história. Hoje, é ele quem será lembrado como símbolo de um tempo de trevas e como exemplo de que nenhum poder é eterno quando confrontado pela verdade dos povos que nunca se curvaram.


E, se há algo que a sentença de hoje prova, é que a Terra, paciente e justa, sempre devolve ao homem o peso das suas próprias ações.


A justiça tardou. Mas chegou. E chegou em nome dos povos indígenas do Brasil.


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