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No mês da COP30, retrocessos ambientais no Congresso e no STF expõem contradição do governo Lula

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O Brasil atravessa um dos meses mais contraditórios de sua história recente no campo socioambiental. Enquanto a cidade de Belém, no coração da Amazônia, recebeu líderes globais para a COP30 — apresentando o país como referência na proteção da floresta — o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal avançaram em medidas que desmentem essa narrativa e expõem um profundo abismo entre discurso oficial e prática institucional.

 

A derrubada dos vetos ao chamado PL da Devastação e a decisão do ministro Gilmar Mendes de levar ao plenário virtual o julgamento do Marco Temporal criaram perplexidade entre ambientalistas, organizações sociais, lideranças indígenas, quilombolas e especialistas em clima e direitos territoriais.

 

Um retrocesso histórico em plena vitrine mundial

 

No mesmo mês em que delegações internacionais desembarcaram no Pará para discutir o futuro climático do planeta, o Congresso restaurou 52 dispositivos do projeto de licenciamento ambiental vetados pelo presidente Lula (PT/Frente Ampla).

 

Entre os pontos reincorporados está o autolicenciamento para obras de médio porte — mecanismo que dispensa estudos de impacto ambiental e reduz a avaliação prévia a simples declarações dos empreendedores. 

A medida entrega ao agronegócio e às mineradoras um “passe livre” para avançar sobre ecossistemas sensíveis na Amazônia, no Cerrado e na Mata Atlântica.

Governadores e prefeitos, por sua vez, celebram o que especialistas descrevem como o início de uma “guerra ambiental federativa”, na qual estados e municípios competirão para oferecer a regulação mais permissiva. Biomas historicamente fragilizados passam, assim, a depender da conveniência política local.

 

O PL também enfraquece a proteção de povos indígenas e quilombolas ao retirar a obrigatoriedade de manifestação da Funai e da Fundação Palmares para empreendimentos em áreas ainda não homologadas.

 

A mudança é uma forma de apagamento institucional, atingindo justamente povos que há décadas aguardam a conclusão de processos de demarcação.

 

Lideranças indígenas classificam a medida como a institucionalização do racismo ambiental, pois abre caminho para "empreendimentos" avançarem sobre territórios reivindicados.

 

STF reacende a tese do Marco Temporal

 

No Judiciário, o ministro Gilmar Mendes decidiu pautar para dezembro o julgamento do Marco Temporal no plenário virtual. A tese, rejeitada pelo próprio STF em 2023, restringe o direito à terra apenas às áreas ocupadas até 5 de outubro de 1988.

 

Lideranças indígenas ouvidas pelo Info.Revolução apontam que se trata de um “duplo ataque”: no mesmo mês em que povos como os Munduruku pressionaram o governo Lula a anunciar novas demarcações, o STF retoma uma agenda que pode paralisar dezenas de processos e reacender conflitos fundiários em toda a Amazônia Legal.

 

A escolha do julgamento virtual levanta suspeitas de influência direta do agronegócio. Movimentos sociais reivindicam julgamento presencial, para evitar decisões aceleradas e pouco transparentes sobre direitos constitucionais.

 

Politica ambiental do governo Lula torna o cenário mais complexo

 

Apesar de se posicionar contra o PL da Devastação, o governo Lula enfrenta críticas pelas próprias contradições. Ao mesmo tempo em que afirma defender políticas de preservação, o Executivo liberou a urgência para a exploração de petróleo na Margem Equatorial e editou o Decreto 12.600, que privatiza a gestão dos rios Tapajós e Tocantins, no Pará, e do rio Madeira, em Rondônia. A medida transfere para a iniciativa privada a responsabilidade pela manutenção da navegabilidade desses rios, incluindo a execução de dragagens em pontos críticos e a adoção de ações como sinalização de canais e gestão do tráfego de embarcações.

 

A declaração da ministra Marina Silva — “O lucro do petróleo deve financiar a transição energética” — ampliou o desconforto entre ambientalistas, que acusam o governo de manter um modelo econômico baseado na extração predatória e incompatível com qualquer projeto de futuro para a Amazônia. 

Militantes ecossocialistas apontam que a estratégia do governo de “governar para todos” é, ao mesmo tempo, utópica, reacionária e ambientalmente insustentável. Não é possível conciliar proteção dos povos tradicionais com os interesses do agronegócio, do petróleo e das mineradoras — setores que historicamente impulsionam a destruição da floresta.

COP30 vira palco de um Brasil dividido

 

Para lideranças indígenas e organizações internacionais, a coincidência entre os retrocessos e a realização da COP30 não é apenas simbólica: expõe a distância entre o Brasil apresentado pelo governo ao mundo e o Brasil que opera internamente.


Enquanto Belém “acolhe” debates globais sobre clima, o país aprova flexibilizações que tendem a ampliar o desmatamento, liberar empreendimentos arriscados e intensificar conflitos territoriais.

 

Mobilização cresce diante do risco de regressão

 

Frente ao avanço das medidas, movimentos indígenas, quilombolas, ambientais e de direitos humanos anunciaram uma ofensiva jurídica e política. Ações de inconstitucionalidade devem ser protocoladas no STF, e cresce a pressão pela realização de um julgamento presencial do Marco Temporal.

 

Não está descartada a possibilidade de uma marcha nacional em Brasília para impedir os retrocessos. Mobilizações vão ocorrer!

 

Entre discursos oficiais e decisões que caminham na direção oposta, o governo tem, na prática, se alinhado ao chamado capitalismo verde — aquele que promete defender a floresta e o meio ambiente enquanto lucra com uma suposta exploração “sustentável” dos recursos naturais. Diante desse cenário, surge uma pergunta inevitável: de que lado da história você, leitor, deseja estar — o da proteção real ou o da devastação, seja ela aberta ou disfarçada?



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