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Um salário para uma jornada: quando o currículo intensifica o trabalho do professor

 

A jornada de trabalho docente não pode ser tratada como produção de mercadorias numa esteira que regula tempo e quantidade de produtos, afinal educação não pode servir como mercadoria. No capitalismo, a qualidade do trabalho é sempre determinada pela quantidade de tempo (horas) e o mais valor é retirado dessa relação.

 

A luta pela pelo tempo extraclasse do professor é antiga e sua razão está ligada à valorização do trabalho no magistério. No PCCR, Plano de Cargos e Carreira e Remuneração do Estado do Pará de 2010, instituído pela Lei 7.442, a jornada ficou regulamentada em hora aula e hora atividade, na proporção de 75% regência e 25% hora atividade. A primeira refere-se ao tempo direto com a presença do aluno e a segunda define o tempo que o professor tem para planejamento, formação, correção de provas, trabalhos, lançamento de notas e todas as atividades extraclasses.

 

Há uma ilegalidade que o governo não fala. A Secretaria de Educação ainda pratica essa jornada 25% sem a presença dos alunos - Hora Atividade (HA) - quando o legal deveria ser ⅓ como determinado na Lei 11.738/2008. Em termos aparentes a jornada é “igual” a todos os professores, porém quando se estuda a fundo as diversas jornadas divididas pelos componentes curriculares percebe-se inúmeras desigualdades. Há uma distorção latente quando se trata da aplicação em horas, turmas, alunos e quantidade de trabalho na jornada e no currículo praticado pela Secretaria de Educação.

 

Há três jornadas no PCCR. A jornada de 20 (15 aulas - 5 horas atividades), 30 (22,5 aulas - 7,5 horas atividades) e 40 horas (30 aulas - 10 horas atividades). Porém, com a aprovação da Lei do Piso Nacional do Magistério a hora atividade passou a representar ⅓ do total da jornada, logo aqueles que são lotados na jornada de 40 horas semanais deveriam receber o piso nacional para a jornada de ⅔ - ⅓), fato que o governo não cumpre. A jornada também é chamada de “carga horária”, ou seja, um tempo, que na maioria das vezes é superior a jornada de 40 horas e pode chegar até 44 horas semanais com direito a aulas suplementares.

Os professores naturalizaram a jornada ampliada de 220 horas como se fosse algo benéfico por receber 84 aulas suplementares. É um ganho circunstancial, porém, quando calculamos o valor da hora aula percebemos que é pura ilusão, pois ao chegar no fim da carreira o professor percebe que trabalhou mais para o estado e não foi recompensado por essas horas (que incidem na remuneração dos professores, mas não servem para fins de aposentadoria), isto é, são horas perdidas no fim da carreira embora praticadas acima da jornada de 200 horas (150 + 50) e remuneradas em 20% no valor da hora. É esse “adicional” que os professores “ganham” por trabalharem numa jornada estendida que o desvaloriza e o paga de forma precarizada.

Assim, salário e jornada de trabalho são indissociáveis em qualquer profissão e servem ao interesse do Estado e dos patrões. Na rede estadual de ensino público paraense a jornada é variável e incerta, oscila para cima ou para baixo, logo não existe um salário docente (fixo) e sim salários, e isso desmente a mentira publicada pelo Barbalho (“bora trabalhar”, quem?). A maioria dos professores trabalha acima da jornada de 200 horas (40 horas) em função da sua remuneração, da carreira e da aposentadoria, todavia, a jornada não se define somente nas horas, mas varia de acordo com o componente curricular que o professor leciona ou o regime em que ele é lotado.

 

O currículo e a jornada docente apresentam sintomas de desvalorização

 

Na última reforma curricular aprovada no Conselho Estadual de Educação (CEE) em 2023 houveram mudanças gerais na quantidade de horas que interferiu decisivamente na jornada de trabalho (magistério) e nos componentes curriculares, em particular de Sociologia, Filosofia, Artes, Língua Estrangeira e Educação Física.

Os professores foram profundamente prejudicados, na medida em que as disciplinas no geral reduziram em horas, algumas passaram de dois tempos para um tempo de aula, obrigando-os a buscar mais turmas para alcançar a “carga horária” de duzentas horas.

A mudança do Novo Ensino Médio (NEM) interferiu na qualidade do trabalho docente e do ensino, adoeceu muitos professores, precarizou o trabalho e trouxe inúmeros problemas relacionados com a saúde mental dos docentes devido ao assédio moral e institucional frequente. O novo currículo foi feito para fortalecer um sistema de ensino meritocrático, empresarial, privatista e sua base precarizou ainda mais o trabalho docente.

 

O Sintepp está fazendo uma importante pesquisa em 2025 que visa investigar o impacto das condições de trabalho na saúde física e mental dos profissionais da educação no cenário desse “novo currículo”. Você professor que está lendo essa matéria preencha o formulário. Esse levantamento será fundamental na construção de um projeto curricular que responda às desigualdades provocadas pela matriz anterior imposta pelo Conselho Estadual de Educação a mando do empresário Rossieli Soares.

 

A jornada de trabalho do professor está diretamente associada ao currículo no qual ele está inserido, ela interfere diretamente na qualidade de vida, desse modo é necessário a tomada de consciência para que possamos lutar juntos na construção de uma proposta que começa pela disputa do tempo e das horas de trabalho. As “duzentas horas” não podem significar mil alunos para um e trezentos para outro, gerando uma profunda desigualdade na profissão e intensificação do trabalho docente. 

 

Chegou o momento de questionar, estudar e lutar para derrotar aquilo que nos prejudica.


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