Ambientalistas alertam para escalada da repressão a protestos e temem "militarização" da COP30 em Belém
- contatoinforevollu
- 13 de jul.
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Atualizado: 14 de jul.

Leis mais duras, prisões e multas bilionárias marcam o cerco a ativistas ambientais globalmente; Foco na Margem Equatorial e demarcação de terras indígenas aquecem o debate na Amazônia.
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Belém, PA – À medida que a Conferência da ONU para o Clima (COP30) se aproxima, marcada para novembro de 2025 em Belém, no coração da Amazônia, ambientalistas e movimentos sociais expressam profunda preocupação com o crescente cerceamento de manifestações climáticas em escala global e temem que o mesmo cenário se replique na capital paraense. Em diversos países, ativistas estão enfrentando leis antiprotesto mais severas, penas de prisão recordes e ações judiciais bilionárias movidas por grandes corporações.
Um estudo recente da Universidade de Bristol, no Reino Unido, aponta que a Austrália, terceira maior exportadora de combustíveis fósseis, registra a maior taxa de prisões de ativistas em democracias: um em cada cinco manifestantes vai para a cadeia. Essa repressão se estende à Europa e aos Estados Unidos, onde a Anistia Internacional denuncia um "padrão abrangente de ataques sistemáticos" a protestos pacíficos. No Reino Unido, cinco ativistas da Just Stop Oil foram condenados a penas de quatro a cinco anos de prisão por bloquear uma rodovia em 2022, sentenças consideradas as mais longas por protesto não violento na história jurídica britânica, segundo a ONG Global Witness.
Nos EUA, a criminalização alcança patamares financeiros alarmantes. Em março de 2025, o Greenpeace foi condenado na Dakota do Norte a pagar mais de US$ 660 milhões (R$ 3 bilhões) por sua participação no bloqueio de um oleoduto, em uma ação movida pela petroleira Energy Transfer Partners. Sushma Raman, diretora executiva interina do Greenpeace nos EUA, classificou a decisão como "um novo movimento das corporações para usar nossos tribunais como armas para silenciar a dissidência", alertando que isso pode inviabilizar as operações da organização no país.
Cenário de tensão para a COP30
A experiência de eventos anteriores no Brasil, como a Conferência da Amazônia em 2023, reforça a apreensão para a COP30. Naquela ocasião, ambientalistas e movimentos sociais foram impedidos de se manifestar no local do evento, e uma marcha contra a exploração de petróleo na Margem Equatorial foi fortemente monitorada por órgãos de segurança.
Para os organizadores das mobilizações futuras, há uma clara indicação de que a COP30 será "fortemente militarizada", com potencial repressão às manifestações. Não se descarta inclusive a edição de uma Garantia da Lei e da Ordem (GLO) pelo governo federal do presidente Lula, como um mecanismo para controlar protestos que demandem dos governos e chefes de Estado presentes mudanças significativas no controle de queimadas e na redução da emissão de combustíveis fósseis.
A disputa em torno da exploração da Margem Equatorial e a demarcação de terras indígenas são pontos de atrito que tensionam o debate. Em uma recente mobilização no Rio de Janeiro, indígenas, ambientalistas e petroleiros protestaram contra a 5ª rodada de leilões de petróleo da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Dos 172 blocos ofertados, 34 foram arrematados, e 19 deles estão localizados na foz do rio Amazonas, área de alta sensibilidade ambiental na Margem Equatorial e alvo de forte disputa política entre a Petrobras, o Ibama e ambientalistas.
Lideranças indígenas de diversas etnias, como Kaingang, Manoki e Guarani Mbya, denunciam os impactos da exploração de petróleo em seus territórios e cobram o direito à consulta livre, prévia e informada, garantido pela Convenção 169 da OIT. O cacique Tenon Deguá, da aldeia Tapirema e da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sudeste (ArpinSudeste), afirmou: "Esses empreendimentos acontecem sem passar por nós, povos tradicionais. Não escutam os povos indígenas, nem os quilombolas, nem os pescadores. E somos nós os mais atingidos".
Sindicatos e organizações como a Arayara, entraram com ações na Justiça para tentar barrar o leilão. Leandro Lanfredi, diretor do Sindipetro-RJ, classificou a situação como um "verdadeiro escândalo", apontando que a oferta de blocos abrange uma área equivalente a 1% do território nacional, sem consulta aos povos indígenas e com pareceres ambientais desatualizados. Lanfredi também criticou o que vê como um processo contínuo de privatização da Petrobras e esvaziamento de seu papel público, defendendo uma Petrobras "100% estatal, administrada por trabalhadores e trabalhadoras junto com a população, para de fato garantir uma transição energética justa e popular".
Onda de mobilizações sacode o Pará às vésperas da COP30

Um dos sinais mais recentes da tensão em Belém, capital do Pará, foi a ocupação por mais de 30 dias da Secretaria de Educação do Estado do Pará (SEDUC), em janeiro de 2025, por etnias indígenas e trabalhadores da educação do Sistema Modular de Ensino (SOME). Eles exigiam a revogação da Lei 10.820/2024, que extinguia a educação presencial nos territórios indígenas, e conseguiram a revogação da lei. A forma "truculenta" como o governo do Pará tratou o movimento levou lideranças indígenas a alertarem: "Não vai acontecer a COP sem escutar os povos indígenas".
Desde a ocupação da Secretaria de Estado de Educação (SEDUC) em janeiro de 2025, o Pará tem sido palco de uma série de intensas mobilizações sociais, com protestos que se espalham por diversas regiões do estado. A menos de 150 dias para a COP30, o cenário de descontentamento e reivindicações sociais acende um alerta para as autoridades.
Oucpação da BR-163 - Imagem: Coletivo Wahoborun / Mobilização contra Ferrogrão: Imagem: Cristian Arapiun
No Baixo Amazonas e Tapajós, os indígenas Munduruku bloquearam a BR-163 (Cuiabá-Santarém) por semanas, exigindo audiência com o Ministro do STF Gilmar Mendes, o fim do Marco Temporal e a paralisação do projeto Ferrogrão, que ameaça atravessar seus territórios.
Na Região Sul-Sudeste do Pará, indígenas do povo Gavião ocuparam a Ferrovia Carajás para protestar contra a duplicação da linha férrea pela mineradora Vale. A comunidade alega falta de consulta prévia e impactos ambientais e sociais, buscando pressionar a empresa a respeitar seus direitos e realizar a devida reparação pelos danos causados na Reserva Indígena Mãe Maria.
Em Belém, a capital, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) foi palco de duas ocupações. Em abril, indígenas da etnia Turiwara protestaram contra o licenciamento de uma mineradora. Em junho, os Turiwara, Tembé e famílias quilombolas de Nova Betel (Tomé-Açu) retornaram à Semas para denunciar a empresa de transmissão de energia ETEPA, acusada de invadir e devastar seus territórios para instalar torres.
Na região do Baixo Tocantins, a comunidade quilombola da Amarqualta do Baixo Acará ocupou a Secretaria Municipal de Educação do Acará em março e abril, exigindo a construção de uma escola no território e infraestrutura adequada.
A população ribeirinha da comunidade Nossa Senhora dos Navegantes paralisou por 24 horas as obras da Avenida Liberdade no início de julho, denunciando prejuízos ambientais. Moradores da comunidade quilombola do Abacatal também se manifestam desde abril, exigindo reparações do governo do Pará pela mesma obra.
Mobilização da poplulação do Marajó contra o aumento de passagens Fluvias - Imagens: Redes Sociais
No Arquipelago do Marajó, o mês de março foi marcado por um intenso conflito onde moradores entraram em confronto com a Polícia Militar em protesto contra o aumento das passagens fluviais. A mobilização, que se estendeu por quase uma semana, não só engajou a população local como gerou um tenso embate com a força policial deslocada pelo governo estadual para conter as manifestações.
Crise nos serviços públicos e possibilidade de greve geral unificada
Além dos protestos de comunidades tradicionais, servidores públicos estaduais e municipais de Belém também pressionam por melhores condições. Servidores da Educação (SEMEC), Assistência Social (FUNPAPA) e Saúde (SESMA) exigem reajuste salarial, realinhamento ao salário mínimo nacional (muitos recebem R$ 1.044,00 de salário-base), o pagamento do Piso Salarial do Magistério e da Enfermagem (conforme Lei Federal), e melhorias nas condições de trabalho.
Diante da intransigência do governo do Pará e da prefeitura de Belém, os servidores estaduais e municipais não descartam uma greve geral unificada dos serviços públicos entre agosto e outubro, às vésperas da COP30.
Outros setores também se mobilizam: rodoviários têm realizado paralisações relâmpagos, temendo a extinção da função de cobradores de ônibus devido à nova Lei dos Transporte Municipal de Belém, aprovada na administração do ex-Prefeito Edmilson Rodrigues (PSOL). Trabalhadores da Construção Civil das obras da COP30, como o BRT Metropolitano e da Nova Doca, protestam constantemente contra o atraso de salários. A crise na coleta de lixo da cidade intensifica ainda mais o clima de descontentamento.
A intransigência do governo do Pará em atender às demandas dos povos indígenas, quilombolas e servidores públicos, somada à falta de diálogo da prefeitura de Belém com os servidores municipais e a população em geral, pode gerar uma crise durante a COP30. "Tudo poderá estourar e assim comprometer os interesses de muitos que veem na COP uma oportunidade de negócios", afirmam lideranças ouvidas pelo Portal Info.Revolução.
Diante desse cenário, movimentos sociais, sindicatos e ambientalistas prometem realizar manifestações massivas durante a COP30. O objetivo é exigir políticas mais eficazes contra o aquecimento global, a emissão de poluentes na atmosfera e, fundamentalmente, melhorias nas condições dos serviços públicos para a população pobre e trabalhadora da cidade de Belém que detém ainda um dos mais baixos IDH (índice de Desenvolvimento Humano) dentre as capitais do país.
Fonte: Folha de São Paulo, Brasil de Fato
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